RESUMO
Análise da relação homem-computador na educação presencial para alunos de terceiro e quarto graus e seu suporte virtual a distância, do ponto de vista do docente. Enfoca-se a influência do cinema e da publicidade dos anos 80 no desenho dos modelos atuais de interface gráfica para computadores.
Trata-se da evolução do desenho de interfaces a partir da experiência informal do psicólogo experimental J. C. R. Licklider. Aborda-se a importância da transparência do uso da interface para o usuário, a partir da navegação intuitiva e fácil. Discute-se quão provocativa e interativa a relação homem-computador pode ser.
Conclui-se que o docente deve rever seu papel diante desse cenário e como ele pode contribuir em sua construção.
Palavras-chave: Ambiente virtual de aprendizagem, conhecimento, GUI, informação, interface gráfica

ABSTRACT
Analysis of the man-computer relationship in the actual education for students of third and
fourth degrees and its virtual support in the distance education, of the point of view of the
teacher. It is focused the influence of the 80’s cinema and advertising in the designing of the current models of graphical user interface for computers.
It is discussed the evolution of the drawing of interfaces to leaving of the informal experience of experimental psychologist J. C. R. Licklider. It is also considered the importance of the easy and intuitive interfaces for users. It is, as well, analyzed how much provocative and interactive the man-computer relationship can be.
Then it is concluded that the teacher must ahead review its paper in this scenario and how he or she can contribute in its construction.
Keywords: Graphical user interface, GUI, information, virtual environment of learning, knowledge

Quem já teve uma experiência frustrante em um ambiente virtual de ensino, põe o dedo aqui:

Para servir de consolo: não será apenas você quem apertará este botão. Para servir de provocação: você já participou de algum projeto de interface gráfica para um ambiente desse tipo? Então, está na hora de dar sua contribuição.
Nicholas Negroponte diz que “computadores não têm de ser complicados e ‘ser digital’ não precisa ser tão difícil. Ainda segundo Negroponte, na década de 1970 muitos artigos “acadêmicos” que tentavam explicar a razão pela qual os monitores monocromáticos eram considerados por eles “melhores” que os coloridos mas, na verdade, aqueles argumentos apenas justificavam sua incapacidade de produzir uma boa interface a um preço razoável.

Um dos conceitos de interface do final do século passado é o Navegador do Conhecimento, de Alan Kay, que inspirou
a produção do vídeo “The Knowledge Navigator” em 1987. O Navegador do Conhecimento é um dispositivo portátil encomendando na década de 80 pelo então executivo- chefe da Apple, John Sculley, um exemplar de excelência em termos de interface, que vai além dos mouses e menus.

A exemplo do HAL, o computador de 2001, uma Odisséia no Espaço, o Knowledge Navigator exibe uma inteligência que praticamente faz desaparecer a interface física. Semelhante a um livro aberto sobre a mesa de um professor, a reprodução da imagem de um homem representa o ser inteligente, a interface. As tarefas são solicitadas pelo professor, via comandos de voz. Durante sua conversa com a máquina, esta lhe lembra de suas tarefas agendadas. Assim como o HAL, o Knowledge Navigator é capaz de ver, ouvir e responder como se fosse um “ser humano real”.

Tem muita informação dançando por aí acerca da avaliação de interfaces para a educação. Boa e má informação. Pelo dinamismo inerente do meio, já não é possível considerar grande parte daquela do século passado. Se você não usa o mesmo modelo de calça do inverno de 2005, porque seu aluno optaria por uma interface educacional que apenas reproduz a página de um livro se, apesar da falácia acerca de que os jovens lêem menos, o livro é mais prático, fácil e portável que o computador?

O desenho de interfaces para computadores começou em março de 1960, quando o psicólogo experimental J. C. R. Licklider publicou o artigo “A simbiose homem-computador”, disponível em: http://memex.org/licklider.pdf, inspirado numa experiência informal que ele conduziu sobre si mesmo. Decidiu anotar de que maneira o seu tempo no trabalho era utilizado, e como poderia então potencializar seu uso a partir da delegação de algumas tarefas para as máquinas.

Ainda segundo Negroponte, “a ‘facilidade de uso’ tem constituído uma meta tão obrigatória que, às vezes, nos esquecemos de que muitas pessoas simplesmente não querem usar a máquina: querem que ela desempenhe uma tarefa.
Aquilo que hoje chamamos de ‘interfaces baseadas em agentes’ é o que vai emergir como a maneira predominante de computadores e pessoas  comunicarem-se  uns  com os outros.”

Traduzir o conteúdo educacional em tecnologias disponíveis para sua distribuição e entrega depende de muita pesquisa e testes nas duas pontas: junto ao público e diante das opções tecnológicas disponíveis. Regras de diagramação sobre papel não valem para a tela do micro. Projetar um tamanho de fonte menor nem sempre é a melhor opção quando reparamos que este público interage com o teclado sobre os joelhos, afastando e reclinando a cadeira. Nesse caso, letra pequena pode conduzir a falha de comunicação. Isso apenas para ficar no mais elementar.

E os recursos disponíveis? Será que eles são adequados ao público ou apenas ao modelo para o qual foram projetados? Não há dúvida de que uma parte significativa do fracasso de projetos educacionais via WBT (web based training) ou CBT (computer based training) são resultado de interfaces confusas ou pouco intuitivas.
Por intuitividade entenda-se: o usuário sabe exatamente qual o próximo passo dentre as opções que o projeto oferece para uma navegação eficiente. Esquerda ou direita, acima ou abaixo, retornar ou prosseguir; estão claros e bem definidos os caminhos a percorrer?

Superestimar ou subestimar a capacidade do usuário são os dois erros mais freqüentes dos projetos de interface baseados em computador, exigindo demais ou de menos de quem interage no e com o ambiente. Um botão deve ter uma função e apenas uma. Um link deve remeter para um único endereço no hiperespaço e deixar claro qual é este endereço e como eu retorno para onde estava. Mais de um elemento animado na tela divide a atenção e confunde o usuário.

O desafio é como seguir recomendações tão óbvias e básicas, atender às teorias da educação e manter a atenção do usuário e a eficiência do projeto. Uma resposta, não a única, é: aprendizado colaborativo, pesquisa e desenvolvimento. Simples assim, mas nem tanto, pois diante de tantas possibilidades e combinação delas, maximizar as ações depende de estratégia; uma delas é o trabalho em equipe e comunidades de prática para discutir, aprender e ensinar com outros professores e alunos. O desa-fio seguinte é planejar seu tempo para esta tarefa.

Além da construção colaborativa do conhecimento, é preciso pesquisa junto ao público, o que não é assim tão difícil para o professor. Bastam observação atenta e uma boa conversa em sala de aula para extrair informações importantes, ou uma visita aos laboratórios de informática para observar como os alunos comportam-se diante dos micros e das telas que acessam, ou, indo além, uma visita aos Diretórios Acadêmicos para ver como interagem com vídeo games e a televisão. Mas o que requer mais tempo mesmo é o desenvolvimento, pois depende de aprender novos softwares ou soluções, testes e, em muitos casos, o retorno ao ponto inicial, quando a solução não atende à necessidade.

No entanto, o professor não está condenado a ter que aprender um novo software por semana, o que inclusive é pouco nessa área, diante do número de opções e de lançamentos a todo momento. As trocas de informações com outros professores são aqui importantes, pois o ponto de partida é a experiência comentada do outro.

Some-se a capacidade de análise, afinal uma experiência de não-sucesso para um público pode significar uma experiência totalmente diferente para um outro. Por exemplo, experiências multimidiáticas funcionam mais eficientemente para alunos de comunicação, enquanto estudos de caso mediados pelo computador e um sistema de rastreamento de ações têm resultados mais impactantes junto a alunos de administração. Atenção, não é uma regra, apenas um sinal.

Este procedimento merece uma abordagem dedicada exclusivamente a ele, e a proposta é analisar o desenvolvimento das interfaces para ambientes educacionais. Como no desenho de cadeiras, de telefones, ou de um mouse para computador, o foco é o usuário. Tom Kelley, gerente gral da IDEO (www.ideo.com), o mesmo que diz que manual grosso pode ser sinal de que algo está errado com o produto, conta como foi o início do processo de desenvolvimento do mouse do Macintosh®: “quando estávamos projetando o primeiro mouse da Apple em 1982, ainda tínhamos dúvidas se seria melhor fazê-lo com um ou dois botões.

Acreditamos que a Apple tomou a decisão certa ao defender um único botão. A Apple já estava pedindo às pessoas para mudar de um mundo de comandos com base em teclado para um ambiente gráfico, controlado por mouse. Acrescentar um botão era pedir demais aos usuários na primeira versão do produto.”

Pense no projeto não apenas como um produto CBT ou WBT, transfira a mesma importância vital de se fosse um desfibrilador. Se um link estiver quebrado em uma página Web, o prejuízo é pequeno, mas se o usuário de um desfibrilador não sabe em quais pólos se deve conectar os terminais, ele talvez não execute a ação fundamental a que o produto se propõe. Mesmo assim, ainda que pequeno o prejuízo, ele poderia ser o prejuízo fundamental para a compreensão de um conceito para o usuário.
Segundo Lev Manovitch, “as novas mídias são interativas. Em contraste com as velhas mídias, onde a ordem de apresentação é fixa; o usuário pode agora interagir com os objetos. No processo de interação, o usuário pode selecionar objetos que serão exibidos ou caminhos que vai percorrer para chegar ao objetivo proposto. Visto assim, o usuário assume também o papel de co-autor do objeto”. Mais do que transferir o papel do co-autor, o que por si enobrece o processo, é preciso que este papel fique claro para o usuário. No novo papel ele respeita e contribui para o sucesso do processo e do projeto trazendo críticas, opiniões e sugestões que o valorizam.

Quadro 1 – Os objetivos chave ao desenhar interfaces gráficas são:

1. Velocidade de aprendizado: diz respeito a quanto tempo um novo usuário necessita para sentir-se totalmente a vontade com o sistema com o qual interage. Em geral, o usuário não vai querer dispender horas para aprender um sistema que venha a utilizar apenas alguns minutos por semana: “Qualquer sistema que não se consiga ser bem aprendido por alguém que não o conhece, em até 10 minutos, é muito complicado”, diz Ted Nelson (Dream Machines, 1974), estabelecendo a Regra dos 10 Minutos.

2. Velocidade de uso: quanto tempo usuários experientes necessitam para realizar tarefas específicas com o sistema. É crítico usuários necessitarem de muito tempo para tarefas executadas repetitivamente num pequeno espaço de tempo.

3. Taxa de erro: mede a quantidade de erros do sistema durante uma operação completa. A taxa de erro afeta tanto a velocidade de aprendizado como a de uso.

4. Rápida recuperação da usabilidade: avalia a aderência do sistema ao objetivo proposto medindo o grau de facilidade que um usuário, por exemplo, tendo ficado 3 semanas sem acessar o sistema, retoma o acesso sem dificuldade.

5. Atratividade: avalia quanto o desenho mantém o interesse e não proporciona cansaço visual ao usuário.

Quadro 2 – Adaptação das 10 recomendações para criar produtos de Tom Kelley, para a criação de interfaces gráficas:

1. Projete uma entrada triunfal: a primeira impressão é a que fica, lembre-se dos grandes filmes que você já assistiu.
2. Utilize metáforas ou frases para orientar o projeto concentradas nas necessidades e desejos do seu público.
3. Facilite o acesso e a portabilidade.
4. Utilize cores e formas como inspiração e motivação.
5. Fixe regras claras de navegação.
6. Encurte as distâncias.
7. Projete um ambiente à prova de erros do usuário mais desconectado do planeta.
8. Mas se mesmo assim o erro persistir, que não provoque um dano sério e que possa ser reportado pelo usuário.
9. Faça testes críticos antes de publicar seu material e regulares depois disso.
10. Há vantagens para o usuário? Então deixe isso claro para ele.

Bibliografia:
AZEVEDO, Eduardo e CONCI, Aura. Computação Gráfica Teoria e Prática. Editora Elsevier: Rio de Janeiro, 2003.

DAM, Andries van, James D., FEINER, FOLEY, Steven K. e HUGHES, John F. Computer Graphics Principles and Practice. Addison- Wesley Publishing Company: Massachusetts, 1996.

FRIEDHOFF, Richard Mark e BENZON, William. The Second Computer Revolution Visualization. W. H. Freeman and Company: New York, 1998.

KELLEY, Tom; LITTMAN e Jonathan. A Arte da Inovação. Futura: São Paulo, 2002.

MANOVITCH, Lev. The Language of New Media. The Mit Press: Cambridge, 2002.

NEGROPONTE, Nicholas. A Vida Digital. Companhia das Letras: São Paulo, 1996.

ROGERS, Everett M. Communication technology: the new media in society. New York: The Free Press, 1986.

ROGERS, Yvonne I. e SHARP, Helen. Interaction Design Beyond Human-Computer Interaction. John Wiley & Sons: New York, 2002.

SHNEIDERMAN, Ben. Designing the User Interface – Strategies for Effective Human- Computer Interaction – 3rd edition. Addison- Wesley-Longman: Massachusetts, 1998.

SHNEIDERMAN, Ben. Designing the User Interface – Strategies for Effective Human- Computer Interaction – 4th edition preview. Addison-Wesley-Longman: Massachusetts, 2004.

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Matéria publicada na Revista FACOM – FAAP, nº 16 – 2º semestre de 2006. Clique para acessar a versão digital.